Avaliação de Ruído e Fator de Dobra – Afinal, é 3 ou 5 dB?

No nosso primeiro artigo sobre Ruído, discutimos alguns conceitos fundamentais e, também, as curvas de compensação A e C.

Hoje continuaremos a discutir aspectos importantes para o profissional de saúde e segurança do trabalho. Afinal, o prevencionista não deve ser apenas um “repetidor” de coisas que ouviu falar.

Para executar e interpretar corretamente quaisquer avaliações de exposição ocupacional, é preciso saber o que se mede. Com o ruído, evidentemente, isso não é diferente.

Ao final desse artigo, você deverá entender:

  1. O que é o “fator de dobra”, ou “incremento de duplicação de dose”;
  2. Por que os fatores de dobra adotados pela NR-15 e pela NHO-01 são diferentes, e que não estamos sozinhos nessa “bagunça”.

Vamos lá!

Fator de Dobra, ou Incremento de Duplicação de Dose: O Que É?

Já conversamos que o nível de pressão sonora é obtido através de uma escala logarítmica, e não de uma escala linear.

Em uma escala logarítmica, como aprendemos na escola, 3 dB + 5 dB não é igual a 8 dB, por exemplo.

Do mesmo jeito, 2*10 dB não é igual a 20 dB.

Assim, o equivalente energético do dobro de uma exposição de 85dB não é uma exposição de 170 dB.

A “quantidade de dB” que, quando somada a um determinado nível de pressão sonora, implica a duplicação da dose de exposição,  é o chamado incremento de duplicação de dose, ou fator de dobra.

Vale apontar que a duplicação da dose de exposição leva, claro, à redução para a metade do tempo máximo permitido.

Bem, vamos considerar um fator de dobra igual a 3 dB. Se o limite de exposição para uma jornada de 8 horas é de 85 dB, 88 dB permitem uma exposição de apenas 4 horas.

Já se o fator de dobra é igual a 5 dB, com o mesmo limite para 8 horas, uma exposição de 4 horas a 90 dB passa a ser aceitável…

Isso se reflete nas tabelas de tempo máximo de exposição permissível que encontramos na NHO-01 e na NR-15.

A NHO-01 estabelece que o fator de dobra (q) é de 3 dB, enquanto a NR-15 estabelece que q vale 5 dB.

Fator de dobra e Redução do tempo permissível, segundo a NHO-01.

Fator de dobra e redução do tempo máximo de exposição permissível, segundo a NR-15.

Essa confusão de fatores de dobra é exclusividade nossa?

Infelizmente, não estamos sozinhos nesse conflito: a ACGIH e o NIOSH utilizam fator de dobra igual a 3 dB, enquanto a OSHA utiliza 5 dB. Dê uma olhada nesse material, se quiser se aprofundar um pouco:

https://www.cdc.gov/niosh/docs/98-126/pdfs/98-126.pdf

O fator de dobra de 5 dB foi proposto (e aceito) no final dos anos 60, passando a ser questionado anos depois, com novos estudos.

A ACGIH passou a adotar o fator de dobra de 3dB em 1994; a NHO-01 foi editada em 2001.

A adoção do fator de dobra de 3 dB vem sendo sugerida à OSHA há tempos… Quem quiser saber os detalhes dessa discussão, pode consultar o artigo Recommended Changes to OSHA Noise Exposure Dose Calculation.

Esse artigo apresenta um histórico bastante interessante dos estudos realizados sobre o tema. Esses estudos apontam que o uso do fator de dobra de 3dB é, hoje, melhor fundamentado que o de 5 dB.

Vale a pena ler o artigo! Afinal, é interessante entender um pouquinho sobre a origem de algumas “polêmicas”… Além de ser divertido, nos dá mais propriedade na hora de argumentar com nossos empregadores ou com outros colegas. 😉

Ok… Mas, e a NR-15?

Infelizmente, a NR-15 está aí e temos que lidar com ela. Para fins de pagamento do malfadado adicional de insalubridade, devemos seguir o que ela prevê.

Para fins de prevenção, porém, devemos utilizar sempre as melhores informações disponíveis, e os critérios técnicos adequados.  Afinal, nosso objetivo é preservar a saúde do trabalhador. 😉

Para fins previdenciários, o Art. 280 da IN 77/2015 do INSS estabelece que:

Art. 280. A exposição ocupacional a ruído dará ensejo a caracterização de atividade exercida em condições especiais quando os níveis de pressão sonora estiverem acima de oitenta dB (A), noventa dB (A) ou 85 (oitenta e cinco) dB (A), conforme o caso, observado o seguinte:

(…)

IV – a partir de 01 de janeiro de 2004, será efetuado o enquadramento quando o Nível de Exposição Normalizado – NEN se situar acima de 85 (oitenta e cinco) dB (A) ou for ultrapassada a dose unitária, conforme NHO 1 da FUNDACENTRO, sendo facultado à empresa a sua utilização a partir de 19 de novembro de 2003, data da publicação do Decreto nº 4.882, de 2003, aplicando:

a) os limites de tolerância definidos no Quadro do Anexo I da NR-15 do MTE; e

b) as metodologias e os procedimentos definidos nas NHO-01 da FUNDACENTRO.

Sobre ruído, ainda resta muito para conversar: Lavg x NEN, algumas medidas de controle simples… Em breve falaremos sobre isso!

Enquanto isso, leia um pouco sobre como o tempo que o protetor auricular não é usado influencia na sua atenuação aqui:

Omissão de Uso do Protetor Auricular e Efeitos sobre a Atenuação Real

Você vai se surpreender! 😉

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Façamos todos um bom trabalho!

Cibele Flores

Engenheira Mecânica, Engenheira de Segurança do Trabalho, Mestre em Engenharia, Auditora Fiscal do Trabalho e professora em cursos de especialização.

19 Resultados

  1. Amanda disse:

    Onde consta essa informação na NR 15?

    • Cibele Flores disse:

      Olá!
      Essa informação está na tabela com os Limites de Tolerância no Anexo 1. Nas figuras no post está assinalado como você vê o fator de dobra, a partir da redução das máximas exposições diárias permissíveis.
      Espero ter ajudado! 🙂

  2. leandro zara disse:

    Então a conclusão é que temos que usar o Fator q-5 porque tem embasamento legar conforme NR-15, e deixar o q-3 porque ainda não temos embasamento do MTE?

  3. Rodrigo Rodrigues da Silva disse:

    Cibele, ótima explanação. Mas, resta-me uma dúvida. Qual fator devemos aplicar? Será que devemos utilizar a metodologia da NHO -01 e o incremento 5?

    Rodrigo Rorigues

    • Cibele Flores disse:

      Rodrigo, como ouvi de um professor há um tempo atrás: “essa pergunta não tem resposta certa”. 😉
      Para fins de prevenção, não há dúvidas de que devemos usar a metodologia da NHO-01 e o incremento 3. Agora, para fins de INSS e de Laudo de Insalubridade, não tem resposta tecnicamente coerente não… :-/

      • Marcelo Lima disse:

        Colegas, no novo manual de aposentadoria especial do INSS que saiu agora em agosto de 2017, para fins de aposentadoria especial o órgão se posiciona que o fator de dobra deve ser q5.
        Deem uma olhada la.
        Abraço.

        • Cibele Flores disse:

          Oi, Marcelo!
          Obrigada pela contribuição!
          Onde você viu que deve ser 5? No Quadro 17, para as avaliações realizadas a partir de 2004, está previsto utilizar a metodologia da Fundacentro, sem menção aos Anexos da NR-15.
          Se você achar e puder me dizer a página, atualizo e agradeço! 🙂
          Até mais!
          Cibele

          • Henrique disse:

            página 85.
            Se for utilizado audio dosímetro… é o aparelho que utilizamos nas medições afim de emitirmos laudo… então o critério de “dobra” é o Q5.
            NR-15 não cita em seu anexo, menção de NHO, entende-se então que o INSS considera o fator de dobra 5 como legal…. (INTEGRAÇÃO GOVERNAMENTAL MTE e INSS tanto que hoje chamamos de MTPS). As legislações nao podem se contradizer e inibir a ação da outra. …
            Portanto na página 88….
            Demonstra a adaptação da fórmula para se utilizar fator de dobra 5.
            Resumo.: sabemos que o o F.D 3 db é o mais adequado a ser utilizado, só que a legislação se acostumou com audiodosimetros antigos que não possuiam o FD 5 db, fazer o que né, é uma questão da lei de não acompanhar se quer a evolução tecnológica e técnica do assunto.

    • Geraldo Jorge Mayer Martins disse:

      O meu entendimento é de que ao calcularmos a dose de ruido para a interpretação se há ou não insalubridade (trabalhista) utiliza-se q=5. Quando estamos discutindo aposentadoria especial, utiliza-se q=3, legislação previdenciária

  4. Henrique disse:

    errata do resumo: … não possuiam o FD 3 db….

  5. Luane disse:

    Parabéns pela explanação! Sou professora de higiene ocupacional e amo a organização e a forma como você aborda os assuntos.

  6. Ray disse:

    Sou motorista de ônibus a minha exposição é 1° macha- 4 segundos 2 e 4 segundos 3 e 8 segundos 4 14 segundos e 5° macha até para o ônibus como saber o tempo de exposição ? por favor me ajudem

    • Geraldo Jorge Mayer Martins disse:

      Com esta informação não dá para saber a resposta. Alem de trocar a marcha, você acelera, freia, para no ponto, etc. A unica maneira confiável é realizar uma dosimetria de ruído com um dosímetro. Quantas dosimetrias terão que ser feita dependerá do resultado da primeira e de uma análise estatística do ruído no dia que for executada a medida

  7. Fernando disse:

    Olá Cibele, muito bom seu poster, inclusive estava participando de uma palestra e os palestrantes falaram muito bem de vc,…
    Mais vamos lá, pra fins de INSS, qual metodologia e fator de dobra vc utilizaria em um documento seu?

  8. Andre Luiz Silva disse:

    Segue o que está definido no MANUAL DE APOSENTADORIA ESPECIAL DO INSS 2018, Página 89.
    “ATENÇÃO!
    As metodologias e os procedimentos de avaliação das NHO da Fundacentro serão
    exigidos para as avaliações realizadas a partir de 1º de janeiro de 2004, sendo facultada à
    empresa a sua utilização antes desta data. Assim, no período de 19 de novembro de 2003 a 31 de
    dezembro de 2003, a metodologia aceita poderá ser da NHO 01 da Fundacentro ou da NR-15 em
    seu Anexo 1, sendo que o limite de tolerância considerado será de 85 dB(A).”

  9. Carolina disse:

    Boa tarde!

    Pode se dizer que a metodologia utilizada pela NHO-01 (NEN) e a utilizada pelo NIOSH é semelhante?

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