Anexo 3 da NR-9: Calor

Após anos de discussões (necessárias e, infelizmente, não esgotadas), tivemos a publicação do Anexo 3 da NR-9, que trata do Calor. O texto atualizado, já considerando a nova NR-1, pode ser consultado aqui:

https://www.gov.br/trabalho-e-previdencia/pt-br/composicao/orgaos-especificos/secretaria-de-trabalho/inspecao/seguranca-e-saude-no-trabalho/normas-regulamentadoras/nr-09-atualizada-2021-com-anexos-vibra-e-calor.pdf

A estrutura do Anexo 3 é similar à do Anexo 1 – Vibração, e tem o “espírito” que devem ter os Anexos da NR-9: o de detalhar as obrigações ligadas a cada agente específico.

Cabe sempre lembrar que os anexos da NR-9 têm um viés preventivo, enquanto os da NR-15 apenas estabelecem o critério para a exposição ser considerada insalubre.

Nenhuma obrigação do Anexo 3 – Calor é nova, em si; todos os itens, de uma forma mais geral, poderiam ser “enquadrados” dentro da NR-1 e da NR-9.

Mas, como já conversamos aqui, muita gente só faz o que está expresso na Norma. Então esse tipo de anexo se torna necessário…

Vamos aos principais tópicos do Anexo 3!

Informação quanto ao risco e Capacitação

Um item que parece desnecessário (mas não é!) é o 3.1.1, que estabelece que o empregador tem obrigação de orientar os trabalhadores quanto:

  • Aos fatores de risco relacionados à exposição ao calor (condições que poderiam aumentar o risco de sobrecarga térmica, como desidratação, roupas que impeçam a evaporação, uso de betabloqueadores etc);
  • Aos distúrbios relacionados ao calor, com exemplos de seus sinais, sintomas e tratamentos;
  • À necessidade de informar ao superior hierárquico a ocorrência de sinais e sintomas relacionados ao calor;
  • Às medidas de prevenção (em sentido amplo, incluindo obviamente as medidas preventivas e corretivas);
  • Às informações sobre o ambiente de trabalho e suas características;
  • Às situações de emergência e condutas a serem adotadas.

Avaliação Quantitativa de acordo com a NHO-06 – ao menos em parte.

O novo Anexo 3 da NR-9 estabelece que a avaliação quantitativa deverá ser realizada de acordo com a nova NHO-06, que já apresentamos aqui.

No entanto, a NHO-06 não foi adotada integralmente!

Deve ser seguida a NHO-06 para:

  • Determinar a sobrecarga térmica por meio do IBUTG (lembrando que o IBUTG deve ser avaliado no período de 60 minutos corridos de exposição mais desfavorável).
  • Determinar os equipamentos de medição e formas de montagem, posicionamento e procedimentos de uso;
  • Determinar os procedimentos quanto à conduta do avaliador;
  • Medições e cálculos.

Já as taxas metabólicas, os limites de exposição, o reconhecimento dos locais e das condições de trabalho, a interpretação dos resultados e as medidas preventivas e corretivas devem seguir o disposto no Anexo 3, e não o que está na NHO-06.

Uso da ferramenta da Fundacentro para determinação de sobrecarga térmica

Uma novidade é a permissão expressa de utilizar, para fins de estimativa do IBUTG, a ferramenta da Fundacentro. 

Observe que a norma permite o uso no caso de atividades em ambientes externos sem fontes artificiais de calor.

Ela também só deve ser usada no contexto da prevenção, não sendo válida como substituta do laudo de insalubridade. 

Você pode acessá-la no link a seguir:

https://www.gov.br/pt-br/servicos/acessar-aplicativo-que-permite-realizar-estimativas-de-ibutg

Medidas Preventivas e Corretivas

O Anexo 3 estabelece dois conjuntos de medidas a serem adotadas:

  • Quando os níveis de ação forem superados: medidas preventivas.
  • Quando os limites de exposição forem superados: medidas corretivas.

É a mesma lógica já trazida pelo Anexo 1 – Vibração, e que deve pautar os demais anexos a ser publicados.

Como exemplos de medidas preventivas estão a disponibilização de água fresca (ou outro líquido de reposição adequado) e a programação de trabalhos mais pesados preferencialmente nos períodos com condições térmicas mais amenas.

Já como exemplo de medidas corretivas estão a adequação das rotinas de trabalho, a alternância com operações com menor exposição e a disponibilização de locais termicamente mais amenos para pausas.

Quando a exposição se der em locais fechados ou com fontes artificiais de calor, há medidas adicionais:

  • Como medida preventiva, o fornecimento de vestimentas de trabalho adequadas.
  • Como medidas corretivas: a adaptação dos locais e dos postos de trabalho; a redução da temperatura ou da emissividade das fontes de calor; uso de barreiras para o calor radiante; adequação do sistema de ventilação do ar; adequação da temperatura e da umidade relativa do ar.

Será que algumas dessas medidas corretivas não deveriam ser boas práticas, e adotadas de forma natural pelas empresas?

O uso de barreiras para calor radiante, a adequação de sistema de ventilação do ar e a redução da temperatura ou da emissividade das fontes de calor deveriam ser adotadas sempre que possível. 😉

Definição de “Risco de Sobrecarga Térmica e Fisiológica” e PCMSO

O Anexo 3 traz condições para a caracterização do risco de sobrecarga térmica e fisiológica:

  • Quando não forem adotadas as medidas preventivas e corretivas estabelecidas na norma;
  • Quando as medidas adotadas não forem suficientes para a redução do risco.

Quando for caracterizado o risco de sobrecarga térmica e fisiológica, o PCMSO deve prever procedimentos e avaliação médicas considerando a necessidade de exames complementares e monitoramento fisiológico.

Além disso, o PCMSO deve descrever a aclimatização, podendo usar como referência os parâmetros previstos na NHO-06.

E a Insalubridade?

Os critérios para definição de atividade insalubre estão definidos no Anexo 3 da NR-15, publicado junto com o Anexo 3 da NR-9.

Embora não seja nosso objetivo tratar de insalubridade nesse site, vale o alerta:

O anexo vale apenas para caracterizar a insalubridade em ambientes fechados ou ambientes com fonte artificial de calor, sendo expressamente não aplicável a situações a céu aberto sem fonte artificial de calor… 

E agora?

Idealmente, nossa principal preocupação em uma nova norma deveriam ser as medidas de prevenção e controle.

Isso porque limites de exposição não são uma linha divisória entre exposições seguras e perigosas (segundo a ACGIH).

Os limites também mudam com o tempo, o que quer dizer que eles não são “infalíveis”. 😉

Além disso, há muitas variáveis importantes que, em geral, são desprezadas pela maioria quando se trabalha com calor, tais como a aclimatização e a idade do trabalhador.

Ainda que o IBUTG esteja dentro dos limites, a exposição poderá ser prejudicial para trabalhadores não aclimatizados e de maior idade, especialmente em trabalhos de maior intensidade.

Também temos que levar em conta que, muitas vezes, a avaliação do IBUTG não é feita no período de exposição mais desfavorável. Às vezes por má vontade, outras pela dificuldade em coincidir o agendamento da avaliação com a pior exposição possível…

De qualquer forma, poderemos ter um resultado enganoso, que mascare a necessidade de adoção de medidas de controle.

Então se espera que os prevencionistas aproveitem o momento para estudar mais sobre o Calor, e possam propor medidas de controle da exposição mais adequadas do que as que normalmente encontramos por aí…

Façamos todos um bom trabalho!

Cibele Flores

Engenheira Mecânica, Engenheira de Segurança do Trabalho, Mestre em Engenharia, Auditora Fiscal do Trabalho e professora em cursos de especialização.

9 Resultados

  1. Satoshi Kitamura disse:

    Muito bom o artigo. Parabéns.

  2. renato borgonovi disse:

    Olá Cibele, boa tarde

    Sou TST de uma empresa de assessoria e temos muitos clientes da área alimentícia, mais precisamente restaurantes de shoppings (redes).

    Com este novo anexo 3 da NR 9 e a NHO 06, estão surgindo várias dúvidas. E por se tratar de novidade, pouquíssimos artigos são encontrados na internet. Este seu é um deles.

    Bem, queria falar sobre ACLIMATIZAÇÃO.
    Acho que entendi a “alma” do artigo, mas no caso de restaurantes de shopping, que em sua maioria, são pequenos e os ambientes se misturam, entendo que um funcionário que chega cedo no restaurante, começa a preparar as coisas, começa a aquecer chapas, panelas e demais fontes de calor existentes enquanto esta em seu turno normal, creio que isto já seja uma aclimatização, uma vez que a temperatura do ambiente vai aumentando progressivamente.

    É isso mesmo? Isto caracteriza uma aclimatização dos funcionários?

    • Cibele Flores disse:

      No meu entendimento, não.
      Sugiro que vc leia a pg 25 do pdf da NHO-06, que trata sobre aclimatização. Penso que vai ajudar. 🙂
      Até mais!

      • renato borgonovi disse:

        Cibele, foi com base na NHO 06 que tirei esta conclusão.

        Se me permite explicar meu raciocínio:

        “A aclimatização requer a realização de atividades físicas e exposições sucessivas e graduais ao calor, dentro de um plano, que deve ser estruturado e implementado sob supervisão médica, para que, de forma progressiva, o trabalhador atinja as condições de sobrecarga térmica similares àquelas previstas para o sua rotina normal de trabalho.”

        Creio que da forma que relatei a atividade da cozinha, a exposição seja “de forma progressiva”. Ela realmente não é “estruturada e implementada sob supervisão médica”, mas ela acontece naturalmente, de forma progressiva, uma vez que a temperatura vai subindo de forma gradual durante o acendimento dos fogões, fornos e chapas.

        Quando a NHO fala:

        “São considerados não aclimatizados os trabalhadores:

        • que iniciarem atividades que impliquem exposição ocupacional ao calor;
        • que passarem a exercer atividades que impliquem exposição ocupacional ao calor mais críticas do que aquelas a que estavam expostos anteriormente;
        • que, mesmo já anteriormente aclimatizados, tenham se afastado da condição de exposição por mais de 7 (sete) dias;
        • que tiverem exposições eventuais ou periódicas em atividades nas quais não estão expostos diariamente.”

        Na minha avaliação, estes trabalhadores não se encaixam nestas descrições. O primeiro item gera dúvida, mas entendo que ao iniciarem a atividade, o calor ainda não existe.
        Por isso acreditei que eles estivessem aclimatizados.
        O assunto é novo e estou me esforçando para entender. Se puder me ajudar, agradeço.

  3. Julio disse:

    Cibele, bom dia.

    Quantas vezes ao ano deve realizar a medição de estresse térmico, já me falaram uma em cada estação. sabes algo e de onde fundamentar?

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